20 fevereiro 2011

Jogar Palavras no Papel.

Preciso de um caderno novo.
Não preciso de um caderno com muitas frescuras e tal, só precisa ser um caderno companheiro.
Companheiro de todas as horas, todas as ideias. Preciso marcar a mudança.
O que melhor que um caderno, com novos e velhos textos, para isso?
Um caderno que possa repousar minha lapiseira, que eu possa fazer malabarismos com ela e assim um texto nascer... Preciso apenas do caderno...
Os motivos e a mudança eu já os tenho... Aqui comigo há mais do que um simples desejo... Mais do que o "simples amor".
Só me falta o caderno
para poder finalmente
começar o novo
TEMPO.


Cuidado.
Simplesmente jogar as palavras no papel pode, sim, gerar algo bacana. Mas, pode também ser desastroso.
Apenas jogá-las não traz sentido algum. Somente o buscar, o trabalhar, o ler e reler faz com que seus textos tenham um valor maior do que o simples brincar com as palavras.
Pensar significa ter "aquela" ideia e trabalhá-la mentalmente, buscando os sentidos, a melhor forma de expressá-la, buscar e rebuscar novamente o clímax, uma forma verdadeira, independente do tipo de texto para que ela seja bem escrita e, só então pegar o lápis, lapiseira ou caneta e começar a colocá-la no papel. Apreciar cada momento, cada palavra, faz com que o escritor produza mais do que um simples texto.

As cinco primeiras palavras revelam tudo sobre o texto? Blasfêmia...
Trata-se apenas da primeira impressão que você tem de um texto. Ele pode conter mais do que o significado daquelas cinco primeiras palavras, talvez, um pouco hesitantes do autor.

Textos grandes são cansativos? Blasfêmia...
Trata-se apenas de lê-los com calma, encontrando assim um mundo irreal, que fará a sua imaginação voar livremente, participar do texto e, quando ele finalmente acabar... Vai descobrir que ele poderia ter mais, muito mais.

Textos curtos são melhores, mais rápidos e práticos? Blasfêmia...
Em não perder tempo, você perdeu um mundo, sua mente ficou restrita a poucas palavras, aquele pequeno universo não faz com que busque mais sentidos, com a maior liberdade e pode até te fazer viajar pelas fronteiras perigosas da interpretação dúbia. Eles têm seu valor, mas devem ser pensados com calma para que o mundo e o clímax estejam ali, sem perdas. Não deve ser apenas um jogar de palavras no papel como a exemplo da primeira parte deste post.
Cada um tem o poder de expressar seu sentimento de uma forma ou outra... Mas não podemos simplesmente ignorar o expressar do outro pelo fato de que esse não combina com o seu jeito. Na literatura, entre o mundo de poesias, histórias, crônicas, poemas, contos e tantos outros, há dimensões variadas de idéias, sentimentos e palavras.

Apenas abra os olhos de sua alma, ou perderá todo o significado.

Arnaldo Jabor




Puta mentira, esse texto não é dele. Haha

Mas também não é meu. Mesmo que, em sua totalidade, ele reflita a minha opinião. Existem textos e textos, arte e arte. Não há como comparar, tal como não há como eleger melhores e piores.
O que se pode fazer é escolher qual delas mais te agrada. E, se sua mente assim permitir, tentar apreciar as formas variadas.
Sem tentar mudar. E sem desmerecer.

Pois a arte não é uniforme, não segue regras nem diretrizes. A beleza da arte está, como dizem, nos olhos de quem vê. A questão é ver.

E, minha opinião pessoal: contos superam em muito poemas. Por que exigem da tua imaginação um trabalho que o poema não. Não que a poesia não interaja com a criatividade do leitor. Mas ela o faz de uma forma diferente. Menos desafiadora, mais detalhada.

Prefiro histórias. Prefiro ficção. Prefiro ler por horas a fio. E é isso aí. Isso exemplifica o meu blog. E tantos outros que por aí estão. Contos longos, bem trabalhados [não no caso dos meus, a humildade me obriga a dizer] e que te fazem "perder" mais do que 2 minutos a fim de que possa apreciar.

Mas também, entendo minha incompreensão... Em um mundo ágil e prático, quem tem tempo para ler mais do que dois parágrafos? A graça das coisas é ler o resumo. A praticidade de exprimir sentimentos em poucas palavras. Pena, não consigo. Por mais que eu ame as coisas simples, meus sentimentos, em sua maioria, são complexos.

Paciência.
Só sei que, quando a hora derradeira chegar e, seja quem for, me perguntar como foi minha vida, quero poder dizer: "jovem, sente-se aí e se prepare, porque a história vai ser longa."
Já pensou, sua vida em dois parágrafos? Medo!

Simplicidade tem lugar. E não é na literatura. Quero calhamaços gigantescos. Quero Senhor dos Anéis. E tenho dito.

17 fevereiro 2011

Eu Prefiro as Flores.

Dia desses ouvi, ou li, sei lá, uma garota dizendo algo mais ou menos assim: "não me dê flores, pois elas murcham e logo morrem."

E então eu me senti ofendido. Porque, admito, eu sou do tipo de cara que daria flores para uma garota. E aí, vem alguém e me diz que o meu gesto não é bem quisto? Quer dizer... garotas não gostam de flores? Flores são um gesto sem significado? Sem valor? Uma forma efêmera de demonstrar afeto?

Espera aí... isso modifica toda a minha infância...


Então ouvi alguém dizer que, se você quer demonstrar amor, você deve dar para a garota algo especial, cheio de significados. E veio logo a menção ao ouro. Jóias, no geral.

Daí eu tive a epifania.

Muitas mulheres gostam de ouro por causa do que ele representa.
Vamos tomar o ouro como exemplo, por favor. Não estou generalizando. Mas vamos lá...

O ouro é encontrado em minas, rios, bancos... sei lá. Normalmente em uma forma rústica, bruta. Sem brilho. E então, é preciso trabalhá-lo. Valorizá-lo. Torná-lo belo, forte, resistente, valioso. Para que então, se torne algo durável, aprazível aos olhos, de imensurável valor.

E eis que é isso que as mulheres querem. Algo que represente um sentimento sólido. Algo resistente, duradouro. Que possa ser ostentado por longos anos, por tempos e tempos. Algo que valha por si só.
Pois assim, quando presenteadas com algo assim, elas se sentem valorizadas. Não nos limitemos a ouro. Qualquer objeto, ou mesmo gesto, que seja dispendioso, trabalhoso, grandioso, ganha o coração de uma mulher por si só. Pelo esforço que demanda. Por fazer a mulher se sentir valorizada.

Mas... e as flores? Que nascem no chão descuidado, desabrocham mesmo abandonadas... Vivem suas existências curtas, apenas pelo prazer de se abrir e alegrar, mesmo que por um instante, o ambiente onde estão.
O problema das flores, é que elas são simples. Elas, tão facilmente quanto nascem, morrem. Elas acabam em seguida. E isso às torna um ícone pouco desejável. Afinal, ninguém quer um amor finito.

Mas... elas são simples...
Nascem sem ligar para o que virá a acontecer. Mostram seu esplendor mesmo sem platéia. Findam sua existência sem temer serem esquecidas... E... não é assim que deveria ser o Amor?
Simples? Sem regras, sem demandas, sem ostentações... apenas... Amor...

Eu prefiro as flores porque elas refletem as coisas que eu mais gosto. Não a grandiosidade de uma declaração encenada, mas a simplicidade de um "eu te amo" que não se conseguiu conter...
Não a supremacia de um presente engastado em significações, mas a leveza de uma carícia ou de um sorriso como agradecimento.
Não o gestual de uma demonstração de carinho esplêndida, mas um beijo roubado em um banco na beira de um rio.

As flores representam as coisas simples nas quais o amor reside. E essas coisas acontecem, nos alegram, e terminam.
A magia do Amor, tal como das flores, é saber que a beleza efêmera se esvaí, apenas para dar lugar a outra maior...

Eu prefiro as flores... E prefiro aquelas que são cor de rosa...

07 fevereiro 2011

A Masmorra De Krohm [Final]

Sabia que tentar aproximar-se do adversário seria tolice, visto que o mesmo poderia atacá-lo de diversos meios. Por isso, ele percebeu que deveria entrar e sair de seu raio de ação o mais rápido possível. Quando viu o monstro esmurrar o chão com a cauda e o impacto causado pelo golpe, o plano articulou-se em sua mente. Era arriscado, mas Kael confiava em sua cota metálica, que tantas vezes o salvara durante uma batalha. Ele ergueu-se e empunhou a espada em chamas, pensando em como atacar seu adversário. Retomar sua arma era uma coisa. Agora, causar danos ao monstro seria uma nova questão totalmente diferente. Sabia que o monstro era vulnerável às chamas mágicas de sua arma. Mas ainda assim, ele parecia resistente o bastante para prolongar a batalha por um bom tempo. E se isso era uma preocupação antes, o fato de poder ser abatido por um único sopro de fogo, essa preocupação permanecia. Sua cota metálica era excelente contra danos físicos, mas contra as labaredas infernais do Krohm, nada poderia fazer.

O monstro, irado pelo ferimento em sua pata, avançou contra o cavaleiro, pela primeira vez no combate. Era lento, devido ao seu peso, mas ainda assim, tinha um grande raio de ação. Seus braços, mais longos que os de um humano normal, agitavam as garras a frente do corpo, enquanto sua cauda chicoteava a área às suas costas. E a bocarra continuava escancarada, preparando-se para lançar nova onda de labaredas mortais. Kael avaliou sua situação: o monstro era praticamente inatingível em combate corpo a corpo, e estaria preparado para uma nova investida suicida como a que o cavaleiro empregara a pouco. O guerreiro não dispunha de nenhum ataque à distância, nem havia muito espaço para que conseguisse se manter fora do alcance da fera por muito tempo. Não havia muita saída, ele precisava encontrar uma brecha entre os ataques do monstro e finalizar a luta o quanto antes. Decidiu investir também. Correu até o demônio e, ao se aproximar, aparou o primeiro de seus ataques com o escudo. A pancada fez reverberar o escudo, juntamente com os ossos de seu braço e, finalmente o corpo todo. Os tremores enfraqueceram seus joelhos, fazendo o cair sobre um deles. Porém, não sofrera nenhum dano sério. Mas a outra mão do monstro vinha agora em direção ao seu rosto. Balanceando o corpo, agitou a espada no ar, golpeando o punho da besta, tentando decepar sua mão. Mas o couro do monstro era mais resistente do que parecia, e o guerreiro não conseguiu trespassar-lhe o membro, ficando sua espada encravada no osso do braço da fera. O fogo na lâmina queimou a carne da criatura, levando-a a um frenesi de dor e fúria. Urrando, ela desceu a cabeçorra contra o corpo do guerreiro. Ele sabia que se fosse alvejado por um jato de chamas, neste instante, estaria liquidado, mas o monstro, tomado pela fúria, esqueceu-se desta possibilidade e investiu tentando morder o adversário. Àquela distância, Kael nada pôde fazer, e as presas do monstro ferraram-se em seu ombro direito. Mesmo sob a proteção da armadura mágica, a dor do aperto fez o guerreiro tontear. O monstro, tentava rasgar-lhe a cota metálica, mastigando e pressionando com a mandíbula, mas sem sucesso.
Kael viu-se encurralado. Com a espada presa ao corpo do monstro e as presas do mesmo ferradas em seu ombro, ele não tinha escapatória. Precisava agir rápido para livrar-se daquela situação. Com o braço esquerdo, empurrou a pata do monstro que aparara num primeiro momento, livrando assim o escudo. Então, bateu com o escudo no peito do monstro, tentando enfraquecer seu aperto. A fera ignorou completamente o ataque, parecendo não dar importância à pancada. O guerreiro tornou a tentar, mas nada parecia ter efeito. Então, ele tentou soltar a espada, mas ela ainda estava presa firmemente ao punho do seu adversário. Sem mais alternativas, ele decidiu partir para uma tática suja, porém eficiente. Soltou o cabo da espada, que imediatamente perdeu suas chamas e, erguendo a mão, atacou os olhos do monstro.

Com uma estocada perfeita, o guerreiro acertou em cheio o olho direito do monstro, fazendo-o urrar de dor novamente. Enquanto o monstro berrava, afrouxou a mandíbula no ombro do cavaleiro, permitindo assim que o rapaz empurrasse-o para longe, com o escudo. Mas Kael não abandonou a carga. Conseguira uma importante vantagem, e não deixaria-a passar sem aproveitá-la ao máximo. Enquanto o monstro cambaleava para trás, o cavaleiro correu até ele, agarrou o cabo da espada e, com o escudo, enganchou a ponta da lâmina. Então, apoiando a bota no corpo do animal, ele puxou a espada com todas as forças. O monstro tornou a berrar de dor, quando a lâmina incandescente atravessou sua carne e decepou seu punho direito. Kael caiu para trás, tentando livrar-se das tiras de couro do escudo, que derretia rapidamente sob o efeito das chamas mágicas da Fênix. Livrando-se da proteção desgastada, o cavaleiro ergueu-se. O monstro, ainda se retorcia de agonia, o pulso ferido vertendo sangue verde. Ainda havia a possibilidade de um ataque, e Kael resolveu fazê-lo. Correu novamente até o monstro, pronto para perfurá-lo com sua espada. Mas desta vez o demônio estava preparado, contra-atacando com sua cauda. O cavaleiro precisou fazer uma complicada manobra para desviar-se do ataque, mas a oportunidade não foi perdida. Enquanto rolou para a esquerda, a cauda do monstro esticou-se ao seu lado, e o guerreiro, brandindo sua espada, amputou-a também. Enquanto o toco decepado convulsionava-se e o sangue viscoso espirrava por todos os lados da caverna, o monstro tornou a lançar mão de seu bafo de fogo. Porém, tão aturdido estava, a criatura disparou seu bafo quente para o alto, acertando o teto da caverna. Enquanto a pedra do teto derretia e pingava novamente no chão, Kael afastava-se da besta enfurecida, esquivando-se da pedra derretida que vertia para o chão. Com a torrente de flamas que queimava a pedra, o cavaleiro pode vislumbrar todo o interior da caverna. Ao longe, do lado de onde o monstro viera, era possível visualizar uma escadaria. Provavelmente ele poderia retornar ao calabouço por lá. Mas, antes de qualquer coisa, precisava terminar sua missão.

A pedra derretida que escorria do teto respingava no monstro, queimando sua pele escamada. A besta, contudo, não parecia se importar. Manteve as chamas por mais alguns instantes, para então cessá-las. O teto da caverna começou a ruir, mas o monstro não parecia inclinado a sair de onde estava. Kael percebeu que não teria necessidade de finalizar a luta, pois o monstro seria soterrado pelas pedras que viriam abaixo. Então, ele correu até onde ficara a mão decepada do monstro e agarrou-a. Com a espada, arrancou uma das garras da fera, jogando então a pata inutilizada para longe. Quando a primeira rocha caiu, o guerreiro esquivou-se em direção à escada. No meio da ruína, o Krohm rugiu, furioso, fitando com seu olho bom o cavaleiro. Então, outro fragmento do teto da caverna se desprendeu, este gigantesco, caindo entre o cavaleiro e a fera, selando a criatura no interior da terra. Kael correu escada acima, esquivando-se de uma ou outra rocha que caía em seu caminho. Alcançou a masmorra e, ouvindo os barulhos de trituração lá debaixo, percebeu que a caverna desmoronara por completo. Usou as chamas da espada para iluminar a escada e pôde ver que seus primeiros degraus estavam agora cobertos de pedras. O caminho para a caverna do Krohm estava selado. O monstro, derrotado.

Sabendo que sua missão estava encerrada, o cavaleiro saiu da masmorra, sem maiores dificuldades. Quando finalmente alcançou a superfície, percebeu que era noite. As Luas de Elehndor iluminavam o firmamento, uma de cada lado do céu. Respirando o ar puro da floresta, Kael sorriu, felicitando-se por ter terminado a missão. Sem mais, repôs a espada em sua bainha e partiu em direção à cidade, pronto para cobrar a recompensa por seus serviços.

Nas entranhas da terra, em meio a inúmeras rochas derretidas, um ponto de luz iluminava o completo breu. Uma criatura segurava, entre as garras de sua única mão, um escudo derretido e deformado, enquanto fungava sobre as correias de couro que o antigo proprietário do aparato usava para fixá-lo em seu braço. Guardando o odor de seu rival, o Krohm grunhiu, enquanto adormecia, esperando recuperar-se. O que as lendas antigas mais relatavam acerca desta raça de demônios, era o quão vingativos eles poderiam ser...


06 fevereiro 2011

A Masmorra De Krohm [2]

O cavaleiro pôs-se alerta, erguendo o escudo a fim de defender-se. Virou-se para o lado de onde o ruído parecia ter vindo e esperou. Não havia nenhum novo barulho, nem nada. Os segundos se arrastaram, ele sentia o coração martelando no peito. Adorava estas missões perigosas, de combate, mas via-se agora em uma enrascada assustadora. Não conseguia enxergar nada, estava desarmado e ainda não sabia contra o que lutava. A situação não poderia ser pior.
Então, outro ruído ecoou pelo lugar. Algo pesado triturando pedras. Poderia ser um passo, mas...
Novamente. Os passos se seguiram, vindo de um ponto distante da caverna. Kael continuava em sua posição defensiva, os olhos abertos no breu, tentando vislumbrar algum sinal do seu opositor. De repente, uma luz emergiu da completa escuridão. Ou melhor, um par delas. Dois pontos luminosos surgiram na distância, próximos um do outro, flutuando no ar, uns dois metros acima do chão. Ou de onde o cavaleiro supunha estar o chão. Os pontos de luz vinham em sua direção, vagarosa mas inegavelmente. E então ele notou, estupefato, que aqueles não eram simples pontos de luz. Eram olhos.

Enquanto a criatura portadora daquele parte de olhos luminosos se aproximava, Kael percebia que ela era maior do que ele imaginara. "Preciso da minha espada", sentenciou. Mas, antes disso, precisava fugir de seu oponente. Distanciar-se dele até recobrar sua arma. O barulho do triturar causado pelos passos do monstro aumentava, conforme ele se aproximava. Aproveitando-se disso, o cavaleiro resolveu dar alguns passos para o lado, tentando evitar a criatura. Mas sua empreitada não foi feliz. Assim que movera a primeira perna, ele notou que os olhos da criatura estavam fixos nele, acompanhando-o atentamente. Ele já havia sido flagrado. E não poderia fugir. Então, se a fuga não era uma opção, precisava de sua arma. O quanto antes. Deu alguns passos para trás, ainda com o escudo a sua frente. A criatura não parecia acelerar o passo, apenas continuava a caminhar e fitá-lo. E então, quando ele acreditava não haver mais saída para sua situação, eis que a Deusa da Sorte lhe sorriu. Em um dos passos do monstro, o ruído do triturar das pedras foi substituído pelo tilintar do metal chocando-se com as pedras. O cavaleiro sorriu. Lá estava sua vitória. Só precisava correr em direção ao monstro, então, apoderar-se novamente de sua arma. E foi o que ele fez, sem sequer planejar bem a ação. Nunca fora dado a estratagemas, seu campo era mesmo o das batalhas.

Correu pela caverna, chutando as pedras em seu caminho, guiando-se unicamente pelos olhos do monstro diante de si. O monstro, percebendo a carga, parou abruptamente. E então, algo aconteceu. Logo abaixo dos olhos, outra emanação de luz surgiu. Esta bruxuleava, como o crepitar de uma chama. E era exatamente isso que acontecia. A criatura escancarara sua bocarra e, em seu interior, chamas mágicas começavam a avolumar-se, prontas a serem expelidas na direção do inimigo. Kael entendeu o que estava por acontecer uma fração de segundos antes de ser alvejado. No momento em que o monstro soprou as chamas mortais, o cavaleiro estava preparado, e rolou para o lado. O ar da caverna ficou quente, devido ao poder da língua de fogo. Porém, a parte alarmante foi a visão que as chamas propiciaram. O monstro, iluminado momentaneamente pelo fogo, ficou visível para o cavaleiro, que sobressaltou-se ao reconhecer o que era seu oponente.

Das lendas antigas, dos tempos da Primeira Guerra das Trevas, ouvia-se falar de um demônio dominador do fogo, conhecido por Krohm. Era uma criatura voraz, que vivia unicamente para a destruição. O corpanzil era humano, porém massivo, de pele esverdeada e recoberta de escamas endurecidas, que lhe conferiam uma resistência considerável. Possuia uma cauda bifurcada e móvel, tão ágil quando uma cobra, cada terminação encerrando-se em um poderoso arpão. A cabeça, porém, era a parte realmente assustadora. Deformada, era redonda e desproporcional, recoberta de chifres, dotada de dois enormes olhos com íris em chamas. A boca era grotesca, repleta de dentes dispares e sempre pronta a despejar suas labaredas infernais em suas vítimas. O monstro, como se sabia, gostava de habitar locais ermos, onde pudesse esconder-se e devorar suas presas. Alimentava-se de qualquer coisa que encontrasse, de animais à humanos.

Assim que o monstro terminara de lançar suas chamas, a caverna estava menos escura. As pedras, que agora Kael notara, não eram pedras, mas sim ossos, estavam agora em chamas, crepitando fracamente, produzindo uma pequena claridade. Com a possibilidade de visualizar seu oponente, o cavaleiro sentiu a vontade de lutar renovada. Mas ainda precisava da espada. E esta estava presa sob a pata garrada do monstro. Chegar perto seria um problema por duas razões: o fogo que o monstro cuspiria de suas entranhas, e a cauda mortal que ele agitava ferozmente. Mas o cavaleiro precisava tentar. Poderia ser acossado ao tentar pegar a espada, mas sem ela, seria derrotado pelo cansaço. Conseguira esquivar-se do primeiro ataque, mas, mais cedo ou mais tarde, acabaria por certo alvejado pelas chamas. Enquanto o cavaleiro ainda pensava, o monstro reabriu a bocarra e lançou-lhe outra leva de chamas infernais. Kael rolou para o lado, evitando novamente o ataque. O ar começava a escassear naquela parte da caverna, e o cavaleiro percebeu que precisava sair dali. A escuridão, porém, ainda imperava na região ao redor de onde estavam, e ele temia sair dali e perder-se novamente. Precisava da espada.

O monstro voltou a grunhir, meneando a cabeça e chicoteando o chão atrás de si com a cauda. O movimento lançou inúmeros ossos ao ar. Vendo a cena, Kael teve uma ideia. Ousada. E que provavelmente daria errado. Mas ainda assim... A criatura lançou nova torrente de chamas, e então o guerreiro colocou em prática seu plano. Esquivou-se do jato escaldante com um rolamento para a direita e então correu em direção à espada. Antes que as chamas tivessem se extinguido, o guerreiro rolou novamente e levou a mão a empunhadura da arma, fazendo com que a lâmina da mesma fosse envolta em chamas. As labaredas mágicas fustigaram a pele da criatura nefanda, fazendo-a urrar de dor. Em uma tentativa desesperada de livrar-se da aflição, o monstro chicoteou a cauda contra o cavaleiro que acossava-o. O ataque foi certeiro, e as duas pontas agudas da cauda atingiriam o peito do oponente. Mas Kael esperava por aquele ataque. Erguendo o escudo no momento exato, o guerreiro aparou o ataque da besta. As setas na ponta bifurcada da cauda não infligiram dano ao seu corpo, mas o impacto massivo do ataque lançou-o longe, até chocar-se contra a parede rochosa. A pancada contra as pedras da caverna nada lhe fizeram, devido a proteção de sua armadura. Ao escorregar para o chão, o guerreiro sorriu, agora que empunhava sua Fênix novamente. Sua tática dera certo.


Continua.

05 fevereiro 2011

A Masmorra De Krohm

Não havia luz, Kael percebera.
No início, enquanto ainda tentava recobrar o controle sobre si mesmo, ele questionava-se se podia confiar em seus sentidos. Talvez estivesse tonto o bastante para não perceber que estava de olhos fechados. Talvez tivesse os olhos cobertos e o torpor não lhe permitisse sentir. Mas a estupefação passou e a escuridão permaneceu. Respirou fundo, a fim de se acalmar. Arregalava os olhos na escuridão, mas nada se materializava em seu campo de visão. Tentou levar a mão esquerda ao rosto, mas o movimento foi detido por algo que pesava sobre seu braço: o escudo. Recalculou o movimento e, desta vez, conseguiu mover o braço. Sentiu-se reconfortado por perceber que ainda estava com seu escudo, mas logo essa percepção deu lugar a outra muito menos auspiciosa: sua mão direita nada segurava.

Ele estava de bruços. Ergueu-se com certa dificuldade, as costas e as pernas doendo, por causa da queda, supunha ele. Não lembrava-se de cair, mas, parecia-lhe a única explicação plausível para seu aparecimento em tão ermo lugar. Pôs-se de joelhos, o metal das botas machucando sua pele. Tateou o chão ao seu redor, mas não havia sinal de sua espada. O chão do local onde estava parecia rígido ao toque, tal como rocha. Uma caverna. E era também coberto por pedras estranhamente leves, para o seu tamanho.
Procurou pela espada, às cegas, por mais alguns instantes, mesmo sem muitas esperanças de encontrá-la. Sabia que, para sair dali, seja lá onde "ali" fosse, ele precisava da espada. As fitas de couro do escudo feriam seu braço, mas ele temia soltar a proteção e, caso precisasse, não conseguisse encontrá-lo novamente.

Levou a mão livre à cabeça. O contato de suas luvas com o cabelo acusou-lhe a ausência do elmo. O peso nos ombros, contudo, era prova de que sua cota metálica continuava onde deveria. Cair, de onde quer que ele tenha caído, poderia ter sido fatal, não fosse a armadura. Banhada nas águas sagradas do Lado de Azkrihar, sua armadura era capaz de absorver grande parte dos danos físicos por ele recebidos. Não diferenciava-se de uma armadura normal quando se tratava de um ataque mágico, contudo, o que fazia dela uma vestimenta invejável, mas não definitiva. Seu portador ainda precisava ser cuidadoso quando em uma batalha. Kael, pelo visto, não o fora. Lembrava-se da missão. Do caminho percorrido. De entrar na masmorra. E então, escuridão.

Sua missão era notavelmente perigosa: limpar a antiga masmorra de um castelo recém adquirido por um nobre medroso. A fama do lugar não era das melhores. Pessoas e animais da região sumiam, para que, semanas depois, os restos de seus corpos fossem encontrados na entrada da masmorra. Isso quando reapareciam. Ninguém jamais sobrevivera para contar o que havia naquele calabouço amaldiçoado.
Kael recebera uma ordem específica: mate qualquer coisa que houver por lá. Missões de extermínio eram as suas favoritas. Gostava do calor da batalha, do retinir de sua Fênix em contato com armas e corpos adversários. Mas esta missão não apresentara dificuldade alguma. Desde que entrara na masmorra, só encontrara um ou outro cadáver mutilado. Restos de animais, espadas tomadas pela ferrugem, armaduras inutilizadas por garras ou presas poderosíssimas. Mas nenhum sinal do causador de todo esse estrago. Nenhum ruído, nenhum movimento. Tudo calmo. Tão calmo, que fez com que os apurados instintos do cavaleiro falhassem. E foi aí que ele foi emboscadoa.

Caminhava vagarosamente pelo corredor sujo do calabouço, a espada mágica em punho, chamas douradas bruxuleando ao redor da lâmina. Sua espada, Fênix, havia pertencido a um elfo que Kael derrotara tempos atrás. Pela vitória, ele tomou a arma mágica para si. Poderia passar-se por uma espada longa comum, não fosse o fato de que, sempre que era empunhada, sua lâmina era envolta por uma camada de chamas douradas, capazes de infligir grandes danos ao corpo dos adversários feridos por ela.
A luz proveniente das chamas da espada iluminavam o caminho, por onde o cavaleiro passava. Portava o escudo ereto, pronto para defender-se de qualquer investida da qual pudesse ser alvo. O corredor era de pedra polida, apesar da sujeira nas paredes. Longas manchas escuras, talvez de sangue ressecado, cobriam todo o local. Nas paredes, os archotes apagados passavam a sensação de abandono do local. Kael observava tudo aquilo sem se preocupar muito. Já passara por inúmeros corredores e nada vira. Começava a ter certeza de que não havia com o que se preocupar quando pisou em algo que fez com que seus sentidos disparassem. Enquanto a pedra afundava sob seu peso, o cavaleiro ouviu o barulho de engrenagens funcionando. E então, algo voou em sua direção. Jogando-se para o lado, em um rolamento desajeitado, ele conseguiu desviar-se do projétil. Mas seu pulo de sopetão levou-o diretamente a outra armadilha, desta vez, ainda mais perversa. Assim que encostou-se na parede, uma maça desceu do teto, chocando-se violentamente com seu rosto. E então, o silêncio.

A ausência do capacete agora parecia fazer sentido. Provavelmente a pancada empurrara-o para alguma armadilha, algum alçapão que o lançara nesta caverna escura onde agora estava. Esticou as costas, tentando recobrar-se por completo. Precisava da espada para conseguir se encontrar, mas precisava de iluminação para encontrar a arma. Estava em maus lençóis. "Pelo menos", pensou ele, "estou sozinho aqui." Como resposta, veio de algum lugar próximo um grunhido de enregelar os ossos.


Continua...

03 fevereiro 2011

É engraçado...

É engraçado com o mundo dá voltas e você simplesmente não percebe...

Como as coisas mudam e você nem sente.

É engraçado como você deseja algo a vida toda e, de repente, está diante de você, sem aviso.

Como quando você deseja uma paixão. Algo que seja diferente. Que seja maior. Significativo. Único.
E você deseja tanto, que passa a se enganar. Passa a ver em qualquer broto, uma flor, em qualquer poça d'água, um lago.

Em qualquer sorriso, um amor...

E então, você se engana, se ilude a tal ponto, que acredita que realmente encontrou o que procurava.
E você mergulha no sentimento inexistente. Você quer aproveitar aquilo, mesmo sabendo que, lá no fundo, é só uma miragem.

E o que acontece quando se mergulha num riacho muito raso? Você bate de cara no chão.

E aí a confiança acaba. E acaba a coragem pra se jogar. E a vontade de procurar. E então, você se fecha. Com medo. Isolado. Sozinho.
Mas ainda assim... lá no fundo... desejando encontrar algo diferente. Significativo. Único.

E a parte engraçada é essa. Quando você decide que desistiu. E resolve afogar as suas esperanças. Resolve que acabou. Que nada vai acontecer, que nada daquilo existe pra você. E que a vida é só o que há aí.
É nessa hora que a vida vira o jogo. Que você, já sem esperanças, caminhando só por instinto, só pela sensação de arrastar os pés no chão, resolve fazer algo diferente.

Algo diferente, que muda sua vida pra sempre.
Como o cara que detestava caravanas. E pessoas no geral. Mas resolve, um dia, ir para um evento em uma delas.
Não por acreditar em algo diferente. Apenas pra sentir que não está parado. E esse cara, já sem esperanças, move os pézinhos, um após o outro, mesmo sem vontade ou fé, e entra naquela van. Com o sentimento de nojo estampado no rosto. Se culpando por se expor ao que, provavelmente, seria mais uma experiência ruim. Se preparando para mais um dia que o faria perceber o quão deslocado do mundo ele é.

Mas ele entra na van. E percebe que lá está, senhoras e senhores, aquela por quem ele esperou a vida toda.


Dizem que não existe amor à primeira vista. Bom... eu concordo. À primeira vista, o que há é interesse. Como o cara que entrou na van e, no meio de um bando de crianças aleatórias, vislumbra uma garota tímida, de fulgurantes cabelos roxos. Que no início lhe parecem azuís, confesso.
Ele entra na van sem esperar encontrar algo diferente. Mas encontra. E todo o seu planejamento, de ler um livro durante a viagem, cai por terra. E aí a mente já se perde completamente.

"Cabelos azuís? Isso é sério?"

E vem o choque. E aquela velha sensação que há tanto ele vinha tentando afogar. "Atração". Não do tipo instintivo. Não do tipo vulgar. Uma atração ingênua, boba. "Ela tem cabelos azuís? Que... legal!" E a vontade de falar com ela. E o sentimento do coração batendo de novo. Os sentimentos no geral.

É engraçado como o coração, mesmo depois de tanto tempo sem uso, ainda sabe o momento certo de perder o ritmo. Como quando ela responde. Ou quando encara-o com aquela expressão mista de timidez e interesse. E ele sente o impulso de estar perto dela. Mesmo sem entender o porquê. Mesmo sem justificar. Ele só quer estar com ela. Porque ela é... diferente?

O dia passa, eles se despedem. Ela não demonstra interesse. E aí a história acaba.
E ele pensa: "não sei nem o nome dela. Pena, era uma garota legal".

É engraçado como o tempo passa, e as pessoas que importam, voltam pro nosso caminho. Como ela voltou. Tudo bem que ele teve que correr atrás, mas ainda assim. Lá estava ela de novo. E de novo, sem lhe dar atenção.
Mas ele ainda sentia aquele interesse. E o interesse só aumentava. A cada frase dela, cada palavra, ele via mais e mais que ali estava o que ele procurava. E ele, contrariando sua natureza auto-protetora, continuou insistindo. Indo contra o que ele jurara fazer, expondo de novo seu coração repleto de cicatrizes, ele continuou tentando.

E o tempo passou. E ela percebeu. Percebeu o que ele já sabia. Percebeu o que ela já entendia. Percebeu o que estava escrito: Que ele era o que ela sempre quisera.
E ela relutou. Por ter suas próprias cicatrizes. Por também saber o que significava sofrer. Ela tinha medo. Receava se ferir novamente. E então hesitou. Hesitou e pensou. Pensou e decidiu. Decidiu e prometeu: ela iria esperar.

Só que o esperar dela deixava-o com medo. E ele temia ver a história se repetir. Temia estar, de novo, vendo uma flor onde não havia.

E mais tempo se passou. Até que o que eles sentiam já não se continha. Até que a verdade já lhes estivesse exposta. O medo foi sendo sobrepujado pela confiança. Confiança e certeza. A certeza de que um tinha no outro o que sempre quisera.

É engraçado que os dois ainda hesitavam, mesmo diante do maior sonho que já haviam sido capazes de sonhar. E eles hesitaram. Por medo. Mas por prazer. De prolongar a espera. De ver crescer o sentimento. De sentir o gostinho agri-doce da paixão não revelada. E eles esperaram. Esperaram para ter o que ansiavam por toda a vida. Aquilo pelo qual se guardaram. Aquilo no que acreditavam.

Até que chegou aquela noite. Onde os sentimentos irromperam a barreira do medo. Naquela noite, quando o céu escuro vestia-se de inúmeras nuvens cinzentas e a Lua espiava de sua morava enevoada, eles venceram o caminho entre um e outro. E se encontraram. Primeiro as mãos. Num toque suave, porém abrasador. Um gesto simples, mas que significava tudo. Confiança, certeza, compreensão.
Amor.
Então o beijo. Aguardado, guardado. Singelo, desajeitado, trôpego.

É engraçado que, nenhum dos dois tenha sentido, naquela noite, o que haviam acabado de conseguir. É engraçado que agora o tempo passe e eles ainda se sintam como naquela primeira noite. A saudade, a vontade de estar perto, a necessidade de segurar a mão. E a inocência de quem ama simplesmente por amar, sem pensar no que significa ou poderá significar.

Mas o engraçado mesmo, é que tudo isso só aconteceu, porque ambos fizeram coisas das quais tinham plena certeza que se arrependeriam. Ela, pintou o cabelo. Ele, entrou naquela van.

É engraçado o que o destino, ou Deus, ou o Batman, ou seja lá no que você acredita, reserva para nós. Ou como não há nada reservado, e as coisas simplesmente acontecem.
É engraçado que eles tenham se encontrado. E encontrado um no outro, o que procuravam.

É engraçado que... já não precisem mais procurar. Que eles estão juntos. E agora é só viver.

É engraçado que... o cara que jurou parar de escrever sobre isso, esteja fazendo-o. Confessando o que sente.

É engraçado que eu não saiba como terminar esse post... Não sei como fechar essa história.
Mas pensando bem, ela mal começou. Como então terminá-la? Deixemos em aberto.

É engraçado você não conseguir vislumbrar um final pra melhor história que já viveu.
Por não querer que ela acabe? Engraçado...