06 fevereiro 2011

A Masmorra De Krohm [2]

O cavaleiro pôs-se alerta, erguendo o escudo a fim de defender-se. Virou-se para o lado de onde o ruído parecia ter vindo e esperou. Não havia nenhum novo barulho, nem nada. Os segundos se arrastaram, ele sentia o coração martelando no peito. Adorava estas missões perigosas, de combate, mas via-se agora em uma enrascada assustadora. Não conseguia enxergar nada, estava desarmado e ainda não sabia contra o que lutava. A situação não poderia ser pior.
Então, outro ruído ecoou pelo lugar. Algo pesado triturando pedras. Poderia ser um passo, mas...
Novamente. Os passos se seguiram, vindo de um ponto distante da caverna. Kael continuava em sua posição defensiva, os olhos abertos no breu, tentando vislumbrar algum sinal do seu opositor. De repente, uma luz emergiu da completa escuridão. Ou melhor, um par delas. Dois pontos luminosos surgiram na distância, próximos um do outro, flutuando no ar, uns dois metros acima do chão. Ou de onde o cavaleiro supunha estar o chão. Os pontos de luz vinham em sua direção, vagarosa mas inegavelmente. E então ele notou, estupefato, que aqueles não eram simples pontos de luz. Eram olhos.

Enquanto a criatura portadora daquele parte de olhos luminosos se aproximava, Kael percebia que ela era maior do que ele imaginara. "Preciso da minha espada", sentenciou. Mas, antes disso, precisava fugir de seu oponente. Distanciar-se dele até recobrar sua arma. O barulho do triturar causado pelos passos do monstro aumentava, conforme ele se aproximava. Aproveitando-se disso, o cavaleiro resolveu dar alguns passos para o lado, tentando evitar a criatura. Mas sua empreitada não foi feliz. Assim que movera a primeira perna, ele notou que os olhos da criatura estavam fixos nele, acompanhando-o atentamente. Ele já havia sido flagrado. E não poderia fugir. Então, se a fuga não era uma opção, precisava de sua arma. O quanto antes. Deu alguns passos para trás, ainda com o escudo a sua frente. A criatura não parecia acelerar o passo, apenas continuava a caminhar e fitá-lo. E então, quando ele acreditava não haver mais saída para sua situação, eis que a Deusa da Sorte lhe sorriu. Em um dos passos do monstro, o ruído do triturar das pedras foi substituído pelo tilintar do metal chocando-se com as pedras. O cavaleiro sorriu. Lá estava sua vitória. Só precisava correr em direção ao monstro, então, apoderar-se novamente de sua arma. E foi o que ele fez, sem sequer planejar bem a ação. Nunca fora dado a estratagemas, seu campo era mesmo o das batalhas.

Correu pela caverna, chutando as pedras em seu caminho, guiando-se unicamente pelos olhos do monstro diante de si. O monstro, percebendo a carga, parou abruptamente. E então, algo aconteceu. Logo abaixo dos olhos, outra emanação de luz surgiu. Esta bruxuleava, como o crepitar de uma chama. E era exatamente isso que acontecia. A criatura escancarara sua bocarra e, em seu interior, chamas mágicas começavam a avolumar-se, prontas a serem expelidas na direção do inimigo. Kael entendeu o que estava por acontecer uma fração de segundos antes de ser alvejado. No momento em que o monstro soprou as chamas mortais, o cavaleiro estava preparado, e rolou para o lado. O ar da caverna ficou quente, devido ao poder da língua de fogo. Porém, a parte alarmante foi a visão que as chamas propiciaram. O monstro, iluminado momentaneamente pelo fogo, ficou visível para o cavaleiro, que sobressaltou-se ao reconhecer o que era seu oponente.

Das lendas antigas, dos tempos da Primeira Guerra das Trevas, ouvia-se falar de um demônio dominador do fogo, conhecido por Krohm. Era uma criatura voraz, que vivia unicamente para a destruição. O corpanzil era humano, porém massivo, de pele esverdeada e recoberta de escamas endurecidas, que lhe conferiam uma resistência considerável. Possuia uma cauda bifurcada e móvel, tão ágil quando uma cobra, cada terminação encerrando-se em um poderoso arpão. A cabeça, porém, era a parte realmente assustadora. Deformada, era redonda e desproporcional, recoberta de chifres, dotada de dois enormes olhos com íris em chamas. A boca era grotesca, repleta de dentes dispares e sempre pronta a despejar suas labaredas infernais em suas vítimas. O monstro, como se sabia, gostava de habitar locais ermos, onde pudesse esconder-se e devorar suas presas. Alimentava-se de qualquer coisa que encontrasse, de animais à humanos.

Assim que o monstro terminara de lançar suas chamas, a caverna estava menos escura. As pedras, que agora Kael notara, não eram pedras, mas sim ossos, estavam agora em chamas, crepitando fracamente, produzindo uma pequena claridade. Com a possibilidade de visualizar seu oponente, o cavaleiro sentiu a vontade de lutar renovada. Mas ainda precisava da espada. E esta estava presa sob a pata garrada do monstro. Chegar perto seria um problema por duas razões: o fogo que o monstro cuspiria de suas entranhas, e a cauda mortal que ele agitava ferozmente. Mas o cavaleiro precisava tentar. Poderia ser acossado ao tentar pegar a espada, mas sem ela, seria derrotado pelo cansaço. Conseguira esquivar-se do primeiro ataque, mas, mais cedo ou mais tarde, acabaria por certo alvejado pelas chamas. Enquanto o cavaleiro ainda pensava, o monstro reabriu a bocarra e lançou-lhe outra leva de chamas infernais. Kael rolou para o lado, evitando novamente o ataque. O ar começava a escassear naquela parte da caverna, e o cavaleiro percebeu que precisava sair dali. A escuridão, porém, ainda imperava na região ao redor de onde estavam, e ele temia sair dali e perder-se novamente. Precisava da espada.

O monstro voltou a grunhir, meneando a cabeça e chicoteando o chão atrás de si com a cauda. O movimento lançou inúmeros ossos ao ar. Vendo a cena, Kael teve uma ideia. Ousada. E que provavelmente daria errado. Mas ainda assim... A criatura lançou nova torrente de chamas, e então o guerreiro colocou em prática seu plano. Esquivou-se do jato escaldante com um rolamento para a direita e então correu em direção à espada. Antes que as chamas tivessem se extinguido, o guerreiro rolou novamente e levou a mão a empunhadura da arma, fazendo com que a lâmina da mesma fosse envolta em chamas. As labaredas mágicas fustigaram a pele da criatura nefanda, fazendo-a urrar de dor. Em uma tentativa desesperada de livrar-se da aflição, o monstro chicoteou a cauda contra o cavaleiro que acossava-o. O ataque foi certeiro, e as duas pontas agudas da cauda atingiriam o peito do oponente. Mas Kael esperava por aquele ataque. Erguendo o escudo no momento exato, o guerreiro aparou o ataque da besta. As setas na ponta bifurcada da cauda não infligiram dano ao seu corpo, mas o impacto massivo do ataque lançou-o longe, até chocar-se contra a parede rochosa. A pancada contra as pedras da caverna nada lhe fizeram, devido a proteção de sua armadura. Ao escorregar para o chão, o guerreiro sorriu, agora que empunhava sua Fênix novamente. Sua tática dera certo.


Continua.

Um comentário:

É sério?