03 janeiro 2011

O Dia em Que O Jovem Azarado e John Lennon se Encontraram

A manhã não era tranquila. Não. Em absoluto.
Primeiro por causa do despertador. Que não desperta. Um despertador em greve. Talvez seja isso. Uma greve. Talvez ele queira mais recargas diárias. Talvez queira uma música com a qual despertar de maior qualidade. Talvez... bom, talvez seja um simples despertador preguiçoso.
Indiferente. Ele não fez seu trabalho.
E então, o jovem azarado teve de acordar assustado, vestir-se com uma pressa insana, afim de, com sorte, alcançar o seu ônibus a tempo de nele embarcar.

O jovem azarado teve uma manhã de sorte. Seu cabelo não lhe respeitou, nem mesmo sob o julgo pesado do pente. Mas isso é comum. Desde que o jovem azarado se conhece por gente, seu cabelo teve sua própria vontade. O pobre infeliz lembra-se dos seus tempos puerís, quando se pai apontava para o emaranhado de fiapos negros que se dispunha em sua cabeça e lhe dizia "que belo ninho de ratos, jovem azarado".
E hoje não foi diferente. Cada mecha apontando para um lado, a coisa toda sem sincronia nenhuma. "Não temos padrão", disseram os cabelos revoltos. "Não tenho tempo para arrumá-los", replicou o jovem azarado. E assim ficou. Os cabelos insurgentes, espalhando-se ao sabor do vento, da forma que mais queriam. E o jovem submisso, sem nem pestanejar... "É normal", dizia a si mesmo, tentando se animar...

As passagens pro seu ônibus já haviam acabado, mas isso, também, não era nada bizarro. Não uma nem duas foram as vezes em que o jovem infeliz tinha de esperar o próximo ônibus, sentado num banco qualquer, pensando na vida e no tempo que perdera. "Podia ter dormido mais meia hora..." Mas dessa vez ele resolveu arriscar. Foi até o seu ônibus habitual, já disposto a apenas vê-lo partir, porém o que viu foi que havia lugar. E ele pensou "e aí, será que tento?". A sorte nunca lhe sorrira, mas será que não seria esse o dia? Chegou-se ao motorista e perguntou, "ahn... eu tenho uma passagem pra daqui meia hora... se sobrar lugar, posso embarcar nesse ônibus aqui?" E o motorista o encarou. Mascou o palito que trazia na boca, o que, o jovem azarado pensou, era bem estranho. Quem diabos masca um palito às sete horas da manhã? Mas bem, lá estava um mascador de palitos matinais. E o mascador tinha boas notícias. "Tem lugar sim", ele disse. "Pode embarcar."
E lá se foi o jovem azarado, faceiro como ele só, com sua manhã de sorte exacerbada.
E então, para demonstrar o quão animado estava, ele dormiu. E dormir em ônibus é sempre uma experiência diferenciada. Primeiro por causa do enjoo. E também, por causa das marcas.
As marcas, pra quem não sabe, são aqueles riscos vermelhos que frisam a sua pele quando você dorme sobre alguma superfícia ondulada. Pois bem, o jovem azarado tem um sangue maroto, que não é muito dado a correr.
Se por um instante qualquer alguma coisa pressiona uma veia, o sangue já para. Não quer mais correr, só quer descansar. E então, surge a marca. E elas surgem das formas bizarras. Teias de aranha nos braços, circulos nas bochechas, hieróglifos no pescoço. E lá está o jovem infeliz, repleto de tatuagens naturais. E é assim que ele tem de ir trabalhar.
Mas antes de acordar, antes de poder saltar do ônibus parecendo um mapa-mundi psicoldélico, ele teve o Sonho. Não um sonho. O Sonho. Aquele que ele tem quase todos os dias, desde recentemente. É sempre o mesmo sonho. Os mesmos personagens, os mesmos acontecimentos. E o mesmo desfecho. O sorriso. Um aceno. Ele chega mais parte. E então, a rodoviária.
O ônibus parou fazendo barulho, e o jovem azarado acordou. "Parece que nem na minha manhã de sorte o sonho vai adiante. Deve exigir muita sorte". Talvez. Ou talvez, o Sonho simplesmente não possa mostrar aquilo que o jovem infeliz desconhece... Talvez...

E o jovem azarado chegou ao trabalho. Atrasado. Mesmo sem engarrafamento e mesmo sem tropeçar, parece que é impossível para o pobre infeliz chegar no horário. Mas ele chegou. A camisa preta, com a estampa do seu jogo favorito logo atraí alguns olhares. Mas é sempre assim. "Não se atende em uma agência bancária com esse tipo de roupa". Ele sabe. Mas é assim que ele é. Paciência, não há outra roupa pra usar. O cabelo encrespado também destoa do cenário geral. Afinal, em meio a tanto gel e penteados intocados, aquela massaroca abissal não poderia passar despercebida. Mesmo que inconsciente, a mão voa até as mechas mais revoltas, tentando detê-las, convencê-las a se ajustarem e passarem a viver uma vida regrada. E de nada adianta. Elas até se contêm por um instante. Mas logo são incitadas pelas demais e pronto, já estão na farra de novo. E lá vai o jovem infeliz, a camisa negra atraindo olhares, o cabelo crespo formando opiniões. Mas isso é normal. Nada até então poderia ter deixado o jovem azarado menos animado. Principalmente sabendo-se que haveria o café.

É claro, ele havia esquecido: naquela manhã, haveria um café da manhã especial na agência. Para uma reunião cujo tema era uma surpresa. E, o jovem azarado sorriu. "Indiferente de qual seja a surpresa, pelo menos estarei de barriga cheia."

Mal sabia ele o que o destino lhe reservava...

Um comentário:

  1. Prometo que vou por minha mente pra trabalhar pra fazer um comentário descente!
    u.ú/
    Despertadores só trabaham quando querem, ou seja, quando já estamos acordados antes da hora de acordar... Eles nunca obedecem, mas pelo menos conseguiu pegar o bus \õ\
    E... Ser diferente da "vida regrada" é legal, pelo menos pra mim... :~
    Mas o que era a "grande surpresa"?
    :*

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